quarta-feira, 24 de julho de 2013

Um tratado sobre o sofrimento humano: o livro de Jó

“Alegrem-se em sua esperança, sejam pacientes ao passar por dificuldades e não se afastem da oração.”
(Romanos 12.12 BJC [Bíblia Judaica Completa])

            Nesta mensagem gostaria de comentar sobre algo que provavelmente atinge todos os seres humanos: o sofrimento. Creio que toda pessoa já passou por um período difícil em sua vida, ou talvez esteja passando por ele. E é interessante escutar o que muitos dizem por aí respeito desta situação. Existem pessoas que usam a existência do sofrimento como prova de que Deus não existe. Dizem estas pessoas que se Deus é realmente bom e é todo-poderoso, impediria que o mal atingisse a humanidade. Estas pessoas, biblicamente falando, estão completamente equivocadas a respeito do mal e do caráter de Deus.
            Outras pessoas convidam-nos a ter um encontro com Deus prometendo que nunca mais sofreremos. Isto é outro erro, e não importam quais sejam as intenções destas, estão pregando heresias, conceitos que contradizem a Palavra de Deus.
            O fato é que o mal atinge a todos. O versículo que abri a mensagem pertence à carta que Sha’ul [Paulo] escreveu à comunidade messiânica que se reunia em Roma. No primeiro versículo deste capítulo, o vemos dizendo: “Eu os exorto, irmãos, tendo em vista as misericórdias de Deus que...”. Nesta carta do apóstolo, ele ficou os primeiros onze capítulos ensinando a respeito das verdades a respeito da salvação, e a partir do décimo segundo capítulo, ele começa a mostrar que tipo de comportamento estas verdades precisam produzir em quem as recebeu. E a respeito do mal vemos uma pequena exortação no meio do versículo doze: “sejam pacientes ao passar por dificuldades”.
            É interessante observar esta recomendação de Sha’ul. A palavra usada originalmente e traduzida por dificuldades é θλιψις (thlipsis) uma palavra grega que significa literalmente prensar, pressão, e, num sentido metafórico, opressão, aflição, tribulação, angústia, dilemas. Ela reflete fielmente o sentimento que assola nosso coração ao passarmos por momentos dificeis, não importam quais sejam eles: problemas familiares, fianceiros, doenças e tantos outros. Ao passarmos por estas situações, nos sentimos pressionados por elas, um aperto no peito. Observe que Sha’ul não está dirigindo-se a pessoas que estão longe do Senhor, mas a seguidores do Messias. Isto indica que para Sha’ul, passar por momentos de aflições é natural. E ao passar por estes momentos, os leitores da epístola recebem um conselho: ser pacientes. Mais uma vez, este termo originalmente é υπομενω (hupomeno) que significa permanecer, ficar firme, não retirar-se, não fugir. Deste modo, podemos ouvir Sha’ul nos dizendo, não fuja das tribulações, quando a dificuldade vier sobre ti, permaneça em Deus.
            Quando falamos em passar por momentos difíceis, quase todos nos lembramos de Iyov [Jó]. Este livro retrata o ser humano afligido pelo mal. E nos dois primeiros capítulos de Iyov ficamos sabendo de uma reunião celestial onde o Adversário pede permissão a Deus para derramar sobre Iyov o mal. Nenhum mal é derramado sobre o justo pelo Senhor. Deus permite que o mal venha sobre nós, mas não o derrama sobre nós. Este mal vem através de diversas fontes: a primeira narrada em Iyov é o nosso Adversário, nosso Acusador. Este traz o mal sobre nós não apenas pelo prazer de nos ver sofrer, mas para que através dele possa encontrar falhas em nós. Nosso caráter é revelado quando passamos por dificuldades. Deus nos conhece totalmente, mas nem o Diabo, nem nós mesmos, e muito menos aqueles que nos rodeiam, nos conhecemos totalmente. Quando passamos por situações adversas àquilo que está dentro de nós, muitas vezes escondido, é manifestado. E esta é uma das razões do Senhor permitir que o mal venha sobre nós: trazer ao nosso conhecimento o que verdadeiramente somos.
            Outras fontes do mal que nos assola são nossas próprias decisões, e as decisões daqueles ao nosso lado. Tais decisões são frutos de nosso livre arbítrio, e como tal não serão impedidas pelo Senhor. Se eu decidir trilhar um caminho que trará tribulações sobre mim, por mais que não deseje esta situação, Deus irá respeitar minha decisão. Ele alerta em Sua Palavra, e me ensina como proceder, mas jamais irá agir no meu lugar, ou controlar minhas atitudes ou decisões.
            Quando Iyov passou pela aflição, quatro amigos foram ter com ele, e passaram a procurar a causa do sofrimento. Elifaz em seus discursos mostra que o mal assola o homem devido o pecado. Ele inicia sua conversa com Jó apontando que mesmo que não esteja claro a nossos olhos, somos pecadores e este pecado traz sobre nós adversidades. Mais adiante ele inclusive aponta os pecados de Jó que em sua visão eram a causa de todo o mal: Jó era rico, pois exigia bens de seus irmãos e não utilizou sua riqueza para fazer o bem. Este é o raciocínio presente em muitas pessoas. Não é difícil encontramos alguém que associa uma doença ou qualquer outra adversidade ao indício de que existe algum pecado, conhecido ou não, presente na vida do afligido.
            Bildad [Bildade] em seus discursos apresenta a tradição humana. Ele apela às gerações mais antigas, indicando que a opinião de uma pessoa não vale nada, se comparada aos ensinos dos antepassados. Quando o homem passa por adversidades, não são poucos aqueles que não desejam ouvi-lo, apenas acusa-lo. “As coisas são deste modo mesmo”, dizem, “você não poderá nadar contra a correnteza”. Muitos semeiam desesperança na vida daquele que está com dificuldades. Convencem que Deus está distante do sofredor e nada poderá alterar está realidade.
            Tzofar [Zofar] em seus discursos condena Iyov por sua verbosidade, presunção e pecaminosidade. Chega inclusive a concluir que Jó está recebendo menos do que merece. Quantos acabamos ouvindo isto, ao passar por momentos difíceis.
            Finalmente Elihu [Eliú] após todos se calarem declara que em vez de aprender com o seu sofrimento, Jó demonstra a mesma atitude dos ímpios para com Deus, e esta é a razão pela qual ainda está sofrendo aflição.
            Diferente do ponto de vista dos amigos de Iyov, quando a dificuldade vem sobre nós, não precisamos ficar procurando o que fizemos para merecê-la. Nunca saberemos o que teria acontecido se agíssemos diferente no passado.  Deste modo chega de trazer mais peso sobre nós do que o próprio mal já trouxe. Dificuldade não é sinal de pecado, se fosse assim poderíamos dizer que Yeshua [Jesus] foi um grande pecador. Semelhantemente não podemos focar nossa atenção no que os homens dizem, mas atentar ao que Deus está dizendo. E ele é bem claro ao ensinar que nossos problemas não perdoam pecados. Somente o sacrifício de Yeshua perdoa nossos pecados.  Outro erro que cometemos é ficar procurando o que precisamos aprender com a situação que enfrentamos. Precisamos aprender diariamente com o Senhor, através da Bíblia, a revelação de Deus para nós. Eu aprendo com Ele e na hora da angustia aplico o que aprendi.
            Fugindo destes erros e tendo a consciência que o sofrimento vem sobre todos, precisamos saber que a diferença está em como encaramos nossa tribulação. Usá-la como uma oportunidade de realizarmos aquilo que temos aprendido do Senhor, e através desta atitude passamos a conhecer melhor nosso Deus.
            No final do período de provas, Iyov pode dizer ao Senhor:

“Eu sei que tu podes fazer todas as coisas,
que nenhum dos teus propósitos pode ser frustrado.
“[Tu perguntaste:] ‘Quem é este que esconde o conselho
sem ter entendimento?’.
Sim, eu falei sem entendimento,
de maravilhas muito além de mim, que eu não conhecia.
“[Tu disseste:] ‘Por favor, ouça, e eu falarei.
Farei perguntas e você me dará as respostas’ –
Eu tinha ouvido falar de ti com meus ouvidos,
mas agora os meus olhos te veem;
portanto, detesto [a mim mesmo]
e me arrependo no pó e na cinza”.
(Iyov [Jó] 42.2-6 BJC)


            Iyov pode reconhecer que apesar de suas dificuldades o Senhor estava ao seu lado. E desta maneira mesmo a mais dura angustia pode ser superada. E ele nos ensina a procurar ao Senhor em todos os momentos que enfrentamos, não com questionamentos, mas com confiança de que é Ele quem nos dá forças para permanecermos, mantendo-nos firmes na fé no Messias.

Nenhum comentário: