“Contudo,
Deus é tão rico em misericórdia e nos ama com um amor tão intenso que, mesmo
quando estávamos mortos por causa de nossos atos de desobediência, ele nos
trouxe à vida com o Messias – é por meio da graça que vocês foram libertados.
Isto é, Deus nos ressuscitou com o Messias Yeshua [Jesus] e nos fez sentar com
ele no céu, com o intuito de demonstrar nas eras futuras quão infinitamente
rica é sua graça, quão grande é sua bondade para conosco – que estamos unidos
ao Messias Yeshua. Porque vocês foram libertados pela graça, por meio da
confiança, e mesmo esta não é sua realização, mas um presente de Deus. Vocês
não foram libertados por suas ações; portanto, não têm de que se gloriar.
Porque somos feitos por Deus, criados em
união com o Messias Yeshua para a vida de boas ações já preparadas por Deus
para serem realizadas por nós.”
(Efésios 2.4-10 BJC
[Bíblia Judaica Completa])
Considero salvação um tema muito interessante de falar,
principalmente porque no meio evangélico é uma expressão muito utilizada, mas
pouco compreendida. Vejo muitas pessoas falarem de boca cheia que são salvas,
mas não são capazes de explicar salva do que.
Neste texto a palavra utilizada por Sha’ul [Paulo] no
grego é σωζω, traduzida na BJC como “libertos”, e, em outras versões da Bíblia
como “salvos”. Mas ao pé da letra ela significa resgatar do perigo ou
destruição, e sob este aspecto o entendimento bíblico de salvação é melhor.
Em sua carta aos romanos Sha’ul declara: “porque todos pecaram
e não são capazes de merecer o louvor de Deus.” (Romanos 3.23 BJC). Foi a
conclusão do apóstolo a declaração de David [Davi] de Tehillim [Salmos] 14.3:
“Mas todos se desviaram, todos são igualmente corruptos; ninguém faz o que é
certo, nem mesmo uma única pessoa.” (BJC). Não existe ninguém correto na face
da Terra. A humanidade pelos seus próprios atos está condenada a uma vida
distante daquela planejada e criada pelo Senhor. São as palavras do salmista:
somos seres corrompidos pelo pecado e corruptores. Somos influenciados a pecar
pela natureza pecaminosa que existe em nós e influenciamos aqueles que nos
cercam a fazer a mesma coisa.
Debaixo desta natureza pecadora só existe um destino: “O
que as pessoas merecem com o pecado é a morte; mas a vida eterna é o que se
recebe como presente gratuito da parte de Deus, em união com o Messias Yeshua,
nosso Senhor.” (Rm 6.23 BJC). Existem duas características em Deus que são
inseparáveis: sua justiça e seu amor. Assim sendo, quando pecamos, ou seja,
quando transgredimos o que foi estabelecido por Deus no início de tudo, a
justiça de Deus declara que somos culpados. E como num tribunal, é lançada
sobre nós uma sentença: a morte. A morte num sentido bíblico é mais do que
sessar a vida, é o afastamento permanente do Senhor. Yochanan [João] expressa
em seu evangelho que “[...] a vida eterna é esta: que te conheçam, o único Deus
verdadeiro, e a quem enviaste, Yeshua, o Messias.” (17.3 BJC). Se a morte é o
antônimo de vida, e a vida é o conhecimento de Deus, a morte é estar longe
deste conhecimento.
Mas neste instante a segunda característica do Senhor
entra em ação. “Deus, porém, demonstra seu amor por nós no fato de o Messias
ter morrido a nosso favor enquanto ainda éramos pecadores.” (Romanos 5.8 BJC).
Nos enxergando mortos em nossos delitos e pecados (Ef 2.1) Deus decidiu cumprir
a sentença em nosso lugar.
Certa vez ouvi uma história de um reino onde começaram a
ocorrer muitos roubos. Sem conseguir encontrar o culpado e desejando contornar
a situação o rei promulgou um decreto dizendo que quando o culpado fosse
encontrado este receberia 40 chibatadas como castigo. E mesmo assim os roubos
continuaram. Com os soldados do reino de guarda todas as noites o ladrão
finalmente foi encontrado e para a surpresa de todos era a mãe do rei, uma
senhora de oitenta anos de idade. Neste momento, os olhos de todos voltaram-se
para o rei. Deixaria ele sua mãe livre do castigo decretado, mostrando que a
família do rei está acima da lei, ou aplicaria a lei e condenaria a morte certa
aquela pobre senhora. Todos se espantaram quando o rei deu o seu veredito: sua
mãe era culpada dos crimes e, portanto, deveria pagar a pena recebendo as
chibatadas. O carrasco pegou o chicote e pouco antes de iniciar a seção de
chibatadas o rei pediu uma pausa, abraçou sua mãe e disse: “Que comecem as
chibatadas.” Assim ele recebeu cada um dos açoites destinados a sua mãe. A lei
foi cumprida, e a vida de sua mãe estava salva.
Foi deste modo que o Senhor fez conosco. Somos
considerados culpados pelos nossos pecados, mas Ele pagou a pena por nós, morrendo
em nosso lugar. Esta libertação da sentença de morte que estava decretada sobre
nós só foi possível mediante Yeshua, que decidiu pagar nossa pena. Isto nos
ensina uma grande lição: dizer que somos salvos não significa que somos
melhores que ninguém. Apenas indica que mesmo imerecedores o Senhor decidiu nos
salvar (assim como decidiu salvar a toda humanidade Jo 3.16). O que faz alguns
salvos e outros não é o fato de aceitar ou não a salvação oferecida por Deus
através de Yeshua.
“T’oma
[Tomé] lhe disse: Senhor, não sabemos para onde você vai; então como podemos
saber o caminho?”. Yeshua disse: “Eu Sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém
vem ao Pai, a não ser por mim. Pelo fato de vocês terem me conhecido, também
conhecerão meu Pai; de agora em diante, vocês o conhecem – de fato, vocês o
viram”.
(Yochanan 14.5-7 BJC)
Yeshua, através de seu sacrifício, pagou a nossa pena, e
nos ligou ao Pai. No que diz respeito a nossa salvação, tudo foi feito por Ele.
Só nos resta aceitar este sacrifício, e confiar que tudo já foi feito. A isto
chamamos nossa fé salvífica. Mas existe algo muito importante a respeito de
nossa fé, observe um trecho da carta de Ya’akov [Tiago]:
“De
que adianta, meus irmãos, alguém dizer que tem fé, se não tiver ações que a
comprovem? Esse tipo de “fé” é capaz de salvar? Suponham que um irmão ou uma
irmã não disponha de roupas e do alimento diário e alguém lhe diga: “Shalom
[Paz]! Aqueça-se e se alimente bem!”, sem lhe dar nada do que necessita. Que
bem há nisso? Da mesma forma, a fé por si mesma, se não for acompanhada de
ações, está morta.
“Mas
alguém dirá que você tem fé e eu tenho ações concretas. Mostre-me essa sua fé
sem atos, e eu lhe mostrarei minha fé por intermédio de minhas ações! Você crê
que “Deus é um”? Que vantagem há nisso? Os demônios creem nisso também – esse
pensamento os faz tremer de medo!”
(Ya’akov [Tiago]
2.12-19 BJC)
A fé que temos no Senhor precisa produzir em nós ações.
Não é a ação que irá nos salvar, é Yeshua que já nos salvou. Mas aquilo que
fazemos nos mostra que tipo de fé temos. E tratando-se de nossa salvação, existem
alguns elementos que precisam ser encontra por Deus em nós que evidenciam nossa
fé genuína.
O primeiro desses elementos é o arrependimento. Em uma de suas pregações, Yochanan o imersor [João
Batista] disse: “Se vocês se arrependeram verdadeiramente de seus pecados,
produzam frutos que comprovem isso! E não comecem a dizer a si mesmos: ‘Avraham
[Abraão] é nosso pai!’, pois eu lhes digo que Deus pode, destas pedras, fazer
filhos para Avraham! O machado já está posto a raíz das árvores, pronto para
cortar; toda árvore que não produz bom fruto será derrubada e lançada ao
fogo!”. (Lucas 3. 8 e 9 BJC).
Arrependimento é mais que remorso. Ele pode ser melhor
compreendido como conversão. É você deixar para trás o caminho que estava
seguindo, e rumar para outra direção. Dizer que estamos arrependidos significa
que compreendemos que estávamos andando no caminho errado e que nos
esforçaremos, buscando ajuda em Deus, a caminhar de modo correto. É o início de
uma batalha constante entre nosso espírito renovado por Deus e nossas velhas
vontades.
Diante desta guerra observamos o segundo elemento: uma vida de cruz. O próprio Yeshua nos
ensina: “Se alguém quiser me seguir, deve dizer ‘não’ a si mesmo, tomar sua
estaca de execução e vir atrás de mim. Porque que quiser salvar a própria vida,
a destruirá, mas quem destruir sua vida por minha causa, a encontrará.”
(Mattityahu [Mateus] 16.24 e 25 BJC). Isto significa que precisamos aprender a
dizer não a nossas velhas vontades. Nossa natureza deseja continuar a praticar
aquilo que não se adequa aos padrões do Senhor, e precisamos mortifica-la.
Obviamente, não literalmente, mas não a alimentando, ou seja, não praticando
suas vontades.
Esta decisão gera em nós uma vida de renuncia, como aquela que Yeshua ensina a um dos líderes do povo
judeu, que conhecemos como o “jovem rico” (Lc 18.18 – 30). Precisamos nos
desapegar das coisas desta terra, pois nosso coração está junto com nosso
tesouro (Mt 9.21). Isto não significa que não teremos casa, carro e um bom
emprego. Significa que estes elementos são serão prioridades em nossas vidas.
Tendo o Senhor como prioridade em nossas vidas, passamos
a correr atrás da santidade.
“Esforcem-se pela manutenção da shalom com todos e pela santidade, sem a qual
ninguém verá o Senhor.” (Judeus messiânicos [Hebreus] 12.14 BJC). Reparem que o
autor do texto inicia com “esforcem-se”. Isto mostra que uma vida em santidade
não é algo natural para nós, afinal somos pecadores. A vida em santidade é a
vida ideal que dia a pós dia perseguimos. Dizendo não às vontades de nossa
velha natureza, e alimentando o espírito de Deus que habita em nós passamos
progressivamente a viver mais parecidos com o ser humano que o Senhor criou.
Mais uma vez, estes elementos não vão conquistar nossa
salvação, mas servirão como uma evidência da mesma. É para eles que devemos
olhar para saber se realmente estamos salvos.
Resumindo:
nenhuma obra de nossas mãos poderá nos salvar. Somos salvos porque Deus
resolveu nos salvar. Porém aceitar este posicionamento do Senhor implica em
confiarmos nele, ou seja, implica em fé. A verdadeira natureza de nossa fé é
evidenciada através daquilo que fazemos.