domingo, 11 de janeiro de 2015

O Tanque de Beit’Zata [Betesda]

“Depois disso, houve uma festa, e Yeshua [Jesus] subiu a Yerushalayim [Jerusalém]. Em Yerushalayim, perto do portão das Ovelhas, existe um tanque chamado em aramaico Beit’Zata, no qual fica uma grande multidão de inválidos: cegos, mancos e paralíticos. Um dos que estavam ali era doente fazia trinta e oito anos. Yeshua, vendo esse homem e sabendo que ele estava ali durante um longo período, disse-lhe: ‘Você quer ser curado? ’. O doente respondeu: ‘Não tenho ninguém para me colocar no tanque quando a água é agitada; e, quando tento chegar lá, alguém me ultrapassa’. Yeshua lhe disse: ‘Levante-se, pegue sua esteira e ande! ’. Imediatamente o homem foi curado, pegou a esteira e andou. Isso aconteceu em um shabbat [Sábado]; por isso, os habitantes de Y’hudah [Judá, Judeia] disseram ao homem que havia sido curado: ‘É shabbat! A Torah [ensino, Lei, Pentateuco] não permite que você carregue a esteira! ’. Mas ele respondeu: ‘O homem que me curou disse: ‘Pegue sua esteira e ande’’. Eles lhe perguntaram: ‘Quem é o homem que lhe disse para pegar a esteira e andar? ’. Mas o homem curado não sabia quem ele era, porque Yeshua havia desaparecido no meio da multidão.”
(Yochanan [João] 5.1 a 13 BJC [Bíblia Judaica Completa])

            Nesta mensagem gostaria de refletir a respeito do milagre operado por Yeshua no tanque de Beit’Zata, operada provavelmente no segundo ano do ministério de Yeshua em uma de suas visitas a Yerushalayim.
            Sabemos que a ocasião da visita a Yerushalayim era uma festa, provavelmente uma das três regalim [festas de peregrinação], a respeito das quais Mosheh [Moisés] ensina: “Três vezes ao ano, todos os seus homens deverão aparecer diante de ADONAI, seu Deus, no lugar que ele escolher – na festa de matzah [pão sem fermento], na festa de Shavu’ot [festa das Semanas, Pentecostes] e na festa de Sukkot [Festa das Cabanas, tabernáculos]. Que eles não apareçam diante de ADONAI com as mãos vazias; todo homem deverá contribuir com o que puder, de acordo com a bênção que lhe foi dada por ADONAI, seu Deus.” (D’varim [Deuteronômio] 16.16 e 17 BJC). Muitos especulam que nesta ocasião era a festa de Pesach [Páscoa], a festa de matzah, mas não temos dados no texto que permitam identificar a festa com precisão.
            O fato é que acontecia entre o povo de Deus uma das três regalim, e Yeshua, assim como todos os homens de Yisra’el [Israel] subiram a Yerushalayim para adorar ao Senhor nesta ocasião, e oferecer suas ofertas no Beit Hamikdash [Templo]. Nesta passagem, encontramos Yeshua perto da porta das Ovelhas, um dos portões da cidade de Yerushalayim, próximo da Fortaleza Antônia, por onde entrava a maioria dos animais para os rituais do Templo. Mais precisamente, ele estava caminhando no tanque de Beit’Zata.

            O Tanque de Beit’Zata foi encontrado durante escavações próximas ao Convento de Santa Ana, e era construído em dois níveis, sendo que o agitar das águas acontecia quando a água descia do tanque superior para o inferior.  Nestas escavações foram encontradas esculturas de cobras, moedas e dizeres que relacionam o tanque ao deus greco-romano Asclépio ou Esculápio, representado por um bastão de cura e uma cobra.

Desta forma, apesar do tanque ter sido construído como um reservatório de água para o Templo, após o período dos Macabim [Macabeus], quando ocorreu a helenização de Yerushalayim, o tanque não era um local religioso israelita, mas um lugar dedicado a Asclépio, o deus da cura, um dos deuses mais amigáveis do panteão greco-romano, pois era o deus que agia em prol da humanidade.
Assim, voltando à passagem de Yochanan, aquele homem doente a trinta e oito anos buscava sua cura não no Deus de Yisra’el, mas em um deus pagão. Tratando-se de um israelita isto era algo grave, pois foi ensinado a respeito do Eterno desde sua infância. Mas os trinto e oito anos de doença o fizeram esquecer-se disto.
Os especialistas dizem que se fizemos algo por 21 dias seguidos, isto se torna um hábito. Assim, com certeza ele já havia se acostumado com sua doença e esta condição já havia transformado-o. No início ele lutou contra, procurou a cura, foi atrás de médicos, talvez fez promessas, mas o tempo foi passando, e com ele as esperanças foram acabando. Um dia, ele acabou ouvindo a respeito de um deus diferente: o deus da cura, e passou a frequentar o templo deste deus por um longo período, buscando a cura. Provavelmente para ele esta era sua última oportunidade e desta maneira estar naquele local se tornou algo tão rotineiro e comum que provavelmente ele nem se imaginava vivendo fora daquele local. Talvez nesta altura de sua vida, a cura tenha até ficado em segundo plano, afinal ele só lembrava-se de sua vida doente, as memorias do tempo de saúde ficaram para traz. Fico impressionado ao observar que Yeshua já exercia seu ministério há quase dois anos e havia operando muitas curas, mas este homem continuava buscando um deus greco-romano.
Nossos problemas fazem isto conosco. Quando enfrentamos uma situação adversa inicialmente lutamos contra, não nos conformamos em estar numa situação como esta, buscamos solução, mas muitas vezes ao ver que nada se resolve deixamos a situação nos mudar. Tornamo-nos pessoas amargas, sem esperança, sem fé. Esquecemos que existe um Deus acima de nós. Não conseguimos ver Yeshua a nossa frente perguntando: “Você quer ser curado?”.
Passamos a confiar em sistemas humanos, acreditando que uma pessoa pode mudar nossa situação, e assim elegemos homens e mulheres sagrados para que a partir dos mesmos alcancemos o favor divino. Criamos ou passamos a fazer parte de um conjunto de rituais, achando que nossas ações irão tornar Deus favorável a nós. Visitamos locais e fazemos peregrinações, tentando encontrar aquilo que irá promover a mudança que necessitamos. Mas pessoas sagradas, rituais sagrados e locais sagrados são apenas elementos de uma religião, algo criado pelo ser humano na tentativa de alcançar a Deus. E quando nos envolvemos em tudo isto não conseguimos enxergar que o nosso Deus não precisa ser alcançado, Ele decidiu nos alcançar.
Desde o princípio vemos o Eterno buscando se relacionar com o homem.  Ele foi atrás de Adam [Adão] (Gn 3.9). Ele foi atrás de Kayin [Caim] (Gn 4.9). Ele vem até nós, buscando um relacionamento, assim como Yeshua, o Messias, foi até o homem no tanque de Beit’Zata. Assim, precisamos abrir os nossos olhos para enxergar nosso Deus em nossa frente.
Ao encontrar com aquele doente, Yeshua perguntou: “Você quer ser curado?”. O interessante é que ele não afirmou que desejava ser curado, nem negou este desejo. Ele simplesmente afirmou que nunca conseguiria alcançar a cura, pois não poderia entrar nas águas. Mesmo diante daquele que já efetuara diversas curas, ele continuava se apegando a doutrinas e costumes humanos. Ele não reconheceu a verdade que estava bem a sua frente em meio à vida de mentiras que vivia.
O Senhor nos pergunta a cada instante: “Você deseja que esta situação mude?”, porém muitas vezes nossa resposta é como a daquele homem: “Senhor, não tem como isto mudar!”. Porém não há nada que seja impossível para Deus (Lc 1.37). E este Deus deseja efetuar a mudança em sua vida de dentro para fora. A questão não é a simples cura de uma doença, ou a abertura de uma porta de emprego. Não é somente uma restauração de um matrimônio destruído. A mudança que o Senhor deseja gerar em nós começará em nosso conformismo, passará para o nosso sistema de crenças, e terminará em nossas atitudes.
Precisamos deixar para traz toda esteira que nos permite ficarmos deitados em nossos problemas. Acabamos ficando acomodados em nossas dificuldades e tribulações e não fazemos nada para mudar, enquanto a maior mudança que é necessária é a mudança de nós mesmos, de nossos hábitos. Precisamos deixar os “Eu sempre fui assim” de lado, e passarmos a declarar “Renova a minha vida, mude a minha maneira de pensar e agir”. Não estou de modo algum declarando que as doenças que temos são frutos de nossas atitudes, mas independente de nossas condições físicas ou psicológicas, não podemos deixar nossas dificuldades nos derrubar, mas enxergar que temos um Deus que é maior que elas.
Após deixar para traz toda situação de inércia em nossas dificuldades, é necessário revermos em que temos acreditado. Sistemas humanos podem até serem belos e tocarem em nossas emoções, mas quando se trata de alcançarmos a Deus, são totalmente ineficientes. Fazer o que achamos correto nunca dará certo. Rituais e promessas acabam no fundo sendo meras simpatias. Precisamos enxergar além de nossos problemas e das soluções a eles oferecidas pela sociedade que nos cerca nosso Senhor a perguntar: “Você quer ser curado?”. Deus está conosco mesmo nos locais menos imaginados possíveis, assim como Yeshua estava com aquele homem dentro do templo de Asclépio. A grande questão sempre é: nós estamos com Deus?
Este grande Deus veio até nós e nos pergunta: “Você deseja que Eu efetue esta mudança?”, “Você acredita que Eu sou capaz de realiza-la?”. Ele não pergunta o que fizemos, ou qual é a maneira que queremos que opere. Ele questiona se desejamos o Seu operar, se cremos que Ele sabe o que é melhor para nós.
E assim quando desejamos a solução dos nossos problemas que vem do Senhor, o Deus vivo passa a operar dentro de nós nos ensinando a agir de modo diferente, apesar das adversidades. Este é o segredo de nossa caminhada com Deus: enxergar o Pai ao nosso lado mesmo em meio às tribulações. Normalmente temos a tendência de elaborar o projeto de como é a nossa vida perfeita e de como deve ser o agir de Deus em nós, e nos decepcionamos quando Deus não faz a Sua parte. Mas nosso Deus está acima de nossos projetos, e mesmo que não concordemos ou não gostemos do rumo que Ele levou a nossa vida, precisamos nos lembrar de que o desejo de Deus “é bom, satisfatório e fadado ao êxito.” (Romanos 12.2 BJC).
O último ponto interessante na passagem é que a cura aconteceu num shabbat, um sábado, o dia de descanso. Muitos acreditam que o sábado é o sétimo e último dia da semana, e de certa maneira, observando a criação de todas as coisas em B’reshit [Gênesis] 1, esta contagem está correta. Mas tendo em vista que a criação da humanidade só ocorreu no sexto dia, após criar todos os animais, o primeiro dia que o homem viveu foi o shabbat.

Assim, contando desde a criação do homem, cada semana começa com o shabbat, ou seja, nossos dias devem começar descansando no Senhor, sabendo que Ele é o nosso provedor. Foi num shabbat que aquele homem levantou-se curado e deixou o tanque de Beit’Zata. É no conhecimento de ADONAI Yir’eh [ADONAI vê, ADONAI proverá] que deixaremos o que tem nos prendido para traz para caminharmos ao lado de nosso Criador.